Durante o 96º Encoge, o ministro do STJ reforçou o papel dos Cartórios extrajudiciais na eficiência, moralidade e inovação do sistema de Justiça brasileiro
O 96º Encoge (Encontro Nacional de Corregedoras e Corregedores da Justiça do Brasil) reuniu, na semana de 29 a 31 de outubro, corregedores-gerais de todo o país no Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, promovendo debates sobre desafios comuns, troca de experiências e estratégias para uma atuação integrada do Judiciário. Realizado simultaneamente com o 8º Fórum Fundiário Nacional, o encontro deu destaque especial às atividades extrajudiciais, que contaram inclusive com um eixo temático próprio para oficinas colaborativas, reforçando a importância da colaboração entre tribunais e cartórios na construção de soluções mais eficientes para a Justiça brasileira.
O ministro Antonio Saldanha Palheiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), abriu o segundo dia do evento diante de um auditório repleto, composto majoritariamente por corregedores de todo o país, além de representantes de serviços notariais e de registro do Brasil. Em sua palestra sobre “Atuação Integrada das Corregedorias de Justiça”, Palheiro destacou a importância da uniformização das ações nos tribunais para fortalecer a atuação do Judiciário.
A mesa contou ainda com o corregedor-geral da Justiça do Rio de Janeiro e anfitrião do encontro, desembargador Cláudio Brandão de Oliveira; o presidente do Colégio de Corregedoras e Corregedoras-Gerais da Justiça do Brasil (CCOGE) e corregedor-geral da Justiça de Rondônia, desembargador Gilberto Barbosa dos Santos; e o corregedor-geral da Justiça do Rio de Janeiro no biênio 2023-2024, desembargador Marcus Henrique Pinto Basílio, atualmente à frente da 7ª Câmara Criminal do TJRJ.
Serviços extrajudiciais: força e eficiência
O ministro iniciou sua apresentação traçando um breve histórico das corregedorias, desde o período entre os séculos XV e XIX, explicando como atuavam para fiscalizar e assegurar a aplicação da Justiça e do direito do Rei em todo o reino. Segundo Palheiro, foi a partir da Constituição de 1988 que se consolidaram as normas para o funcionamento das corregedorias gerais de Justiça no modelo atual, bem como suas atribuições, que se mostram dinâmicas e essenciais para o pleno funcionamento do Poder Judiciário. O magistrado também mencionou as normas do CNJ e as diversas funções das corregedorias.
Após apresentar essa linha do tempo — passado, presente e futuro —, Palheiro destacou a relevância dos Cartórios na prestação de serviços extrajudiciais, evidenciando seu papel estratégico no fortalecimento da Justiça e na eficiência do sistema. “Eu sou um fã incondicional da utilização dos serviços extrajudiciais. E vou dizer o porquê: nós hoje dispomos de 13.440 cartórios em 5.570 municípios. Olha que força de trabalho excepcional que a gente tem para nos auxiliar muito no sentido da desjudicialização, muito no sentido de absorver tarefas que o magistrado faz burocraticamente, que poderia estar se dedicando a outras tarefas de maior envergadura”, declarou.
O ministro destacou que os delegatários são concursados, com concursos rigorosos e benefícios compatíveis com a responsabilidade do cargo, o que faz com que esses profissionais atuem com alto nível de capacitação, profissionalismo e qualidade. “São concursos tão rigorosos, ou mais rigorosos que a magistratura. Muitos magistrados prestam concurso para o extrajudicial justamente pelos rendimentos que ele proporciona. Porém, são pessoas muito preparadas”, afirmou Palheiro.
Implantação rápida e informatização
Palheiro também destacou a velocidade com que os Cartórios implementam medidas do CNJ, especialmente em sistemas informatizados. “As medidas que o CNJ está adotando para delegar determinadas atribuições para os extrajudiciais são imediatamente implantadas. Se o CNJ diz: ‘Olha, vai ter o cadastro nacional de rede de imóveis…’ Acabou, quinze dias depois está implantado, tudo informatizado. A gente não consegue nem uniformizar o nosso sistema de informática. A gente não tem um sistema de informática único. Isso é inconcebível.”
Ele também lembrou o contexto federativo, que influencia a atuação judicial: “E não podemos esquecer que a gente ainda vive num pacto federativo. Os tribunais têm sua autonomia, se não quiser aderir, não adere. Então a atuação do serviço público é muito ‘enterrada’. E os extrajudiciais dispõem dessa velocidade que é inerente à própria atuação da iniciativa privada.”
Preconceito e reconhecimento internacional
O ministro criticou a percepção equivocada de que os serviços extrajudiciais seriam burocráticos ou ultrapassados: “Existe ainda muito preconceito em serviços extrajudiciais. As pessoas falam, que serviço extrajudicial é uma ‘burocracia, ultrapassada, coisa no século XIX’… Das 10 maiores economias do mundo, 7 têm serviço extrajudicial. 22 dos 27 países que compõem a União Europeia têm serviço extrajudicial. 15 dos 20 países que compõem o G20 também fazem uso. Falar que é ultrapassado, que é burocrata, é uma falácia.”
Especialização e responsabilidade objetiva
Sobre a especialização dos profissionais extrajudiciais e a diferença em relação à atuação judicial, o magistrado comentou que “os Cartórios têm funcionários extremamente bem preparados, até porque eles são especializados. Então, se você observar um Cartório de registro de imóveis, há um profissional responsável pela ordenação das matrículas, outro que cuida da pré-matrícula, e assim por diante. São pessoas altamente especializadas”, disse.
“O delegatário, portanto, tem uma responsabilidade objetiva, direta — algo que nós, magistrados, não temos da mesma forma. O juiz não atua com base em uma descrição objetiva do que deve ou não deve ser feito; sua atuação se pauta, muitas vezes, pela percepção pessoal do que é justo ou injusto — o que, a meu ver, também é uma distorção dentro da própria magistratura”, completou o ministro.
Palheiro também criticou a falta de previsibilidade do Judiciário brasileiro, comparando com sistemas internacionais. Para isso, ilustrou a colocação com um exemplo também utilizado por Luiz Fux, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). “O ministro Fux cita com frequência o exemplo de Delaware, uma jurisprudência extremamente consolidada e divulgada. Os juízes seguem. O juiz americano que não seguiu o precedente pode até perder o cargo. Enquanto não adotarmos uma verdadeira subordinação aos precedentes, não teremos segurança jurídica. Isso afasta investimento, afasta o empresário”, ilustrou.
Segundo Palheiro, no extrajudicial, essa previsibilidade é garantida: “Já no extrajudicial, quando chega uma ordem do Poder Judiciário, o delegatário não diz ‘ah, eu penso diferente’. Ele simplesmente cumpre.”
Maximização e moralidade
Palheiro ainda destacou provimentos relacionados às metas nacionais, ODS e combate a crimes:
- Provimento nº 79/2018: metas nacionais do sistema extrajudicial
- Provimento nº 85/2019: vincula o extrajudicial aos 17 ODS da Agenda 2030
- Provimento nº 88/2019: prevenção e combate ao crime organizado, comunicação de transações atípicas à UIF
- Provimento nº 89/2019: Código Nacional de Matrículas e reforço das práticas vinculadas aos ODS
Antonio Saldanha Palheiro também ressaltou a rapidez do extrajudicial em implementar soluções inovadoras, como central de protestos eletrônicos, habilitação de casamento sem intervenção judicial, inventários, partilhas, divórcios consensuais, retificação de registros e usucapião extrajudicial. “Temos milhares de Cartórios preparados para atuar nessas frentes. Se o comando normativo for disparado, rapidamente poderemos ter mediadores atuando de forma ampla e efetiva.”
Extrajudicial como parceiro estratégico
Palheiro finalizou a colocação afirmando que a atividade extrajudicial é estratégica, previsível e eficiente, contribuindo diretamente para a desjudicialização, segurança jurídica e metas sociais. “O extrajudicial, hoje, atua diretamente em demandas sociais, promovendo desjudicialização e reduzindo o desperdício de tempo e recursos com atividades burocráticas que podem ser delegadas.”
Segundo o ministro, os Cartórios são parceiros essenciais do Judiciário, oferecendo eficiência, especialização e previsibilidade, ao mesmo tempo em que colaboram com políticas públicas e objetivos globais, consolidando o extrajudicial como um pilar da Justiça moderna.
Fonte: Assessoria de Comunicação da ANOREG/BR